Estava sozinho, ou, acompanhado por um estranho e a noite se apresentava clara, sossegada
e os ponteiros do relógio se adiantavam com mais pressa. Um pigarro, ou coisa parecida me
tira do transe; meu companheiro de espera se movimenta muito e a suspeita começa a aguçar
meus ouvidos, e inquietar meus sentidos.
Houve um toque; um sobressaltar do coração e a boca gemeu baixinho. A mão pressionou o
ombro e me virei assustado olhando para as mãos que podiam bem estar empunhando uma arma!
-Calma!- A voz, ao menos não ameaçava.
-O que quer de mim?- Dois passos inconscientes me levaram a me afastar.
-Calma...eu não mordo...Não mais!
Mantive-me a uma distância segura, em prontidão para qualquer golpe ou disparo, pouco me
importando com o assunto de meu interlocutor.
Passado os instantes iniciais de tensão a voz começou a tomar contorno, e quando a calma
veio entabulamos uma simpática conversa!
O pequeno homem calvo vinha da região norte, estava albergado não sei aonde e sua
conversa agora me entretia até a chegada do metro. Parecia entendido em mitologia, e se
dizia fã de Rômulo e Remo, ou melhor, da "Loba" que os amamentou; deu a entender que era
coisa de família.
Do tal mito passou a me perguntar o que havia me assustado naquele encontro e eu revelei
que achava que era um lunático armado. Ele suspirou aliviado e aquilo me intrigou e
passei de interrogado à inquiridor e acabei me descobrindo falando com um "Lobisomem"que
procurava se integrar à sociedade!
Realmente era lunático! Sua "estrutura" não combinava em nada com os mitos, relatos e
fotografias!
-Mais ou menos como os índios meu interesse pelas matas se findou! Cinema, automóveis,
restaurantes...Eu quero conforto!- Se explicou.
-E quanto ao pelo?
-Depilação à laser, hormônios...Não acha que essa discreta calva me caiu bem?
-E a "cara de cachorro"?
-Ótimos cirurgiões! Atendem 24 hrs, e realizaram as cirurgias na lua cheia! Serraram
aqui, enxertaram ali- e mostrou algumas cicatrizes quase imperceptíveis, e no fim da
apresentação me presenteou com cartões dos tais especialistas, e me fez diversas
recomendações de hotéis-clínica especializados em atendimentos no pós-operatório!
-Posso indicar um dentista, ortodontista, meu aparelho mastigatório teve que ser
totalmente readaptado quando em forma lupina!- Mais alguns cartões saltaram na minha mão!
-E as costas arqueadas?- Me indicou ortopedistas.
-E quanto aos instintos animais?
-Muita psicanálise meu amigo!!! Posso indicar! Era uma agressividade latente; desejo por
sangue, instintos sexuais bestiais...tudo coisa do passado! Hoje sou uma nova pessoa!
Menos carne na dieta, menos ira no coração, e desejos mais contidos...
O metro veio deslizando silencioso pelos trilhos, e ao entrar no vagão me perdi daquela
figura curiosa. Então percebi que a ciência começava a trazer das matas mais do que os índios, matando uma cultura, matando o folclore...
Anderson Dias Cardoso.
sábado, 5 de março de 2011
quarta-feira, 2 de março de 2011
A Pequena Crônica De Um Publicitário Em Potencial!
Duas cadeiras das muitas da barraquinha de hot-dogs ocupadas, uma conversa alegre, de
boca cheia; nada de importante apenas a diversão pós aula de sempre.
Interrompidos pela chegada de um amigo e seus novos amigos (coisa que faz parte da natural desagregação de fim do colegial) resolvemos os convidar a tomar assento.
Dessa reunião dois grupos de diálogo se formam, mas água e azeite novamente se repelem; um deles, meio constrangido silencia; e o recém chegado se empolga comentando os projetos musicais da banda que ameaça a se formar.
Eu tento falar ao amigo, mas os amigos do amigo eram mais ilustres e minha voz soou fraca
então preferi o silêncio!
A conversa atingiu o ponto do planejamento da capa do CD e as idéias (muito primárias por
sinal!) foram lançadas para a votação, e das melhores sacaram a tradicional proposta da
figura do monstro!
Monstro devorando, monstro no cemitério, monstro e mulheres nuas, monstro rasgando a capa do CD e saltando para fora...E enquanto decidiam a fonte e localização geográfica da mesma no CD eu pude escutar o nome da banda: "The Intruders"!!!
A negociação se desenvolvia empolgadíssima, e uma idéia me veio à mente, e desejei tomar parte da conversa:
- A banda se chama "The Intruders"?- Ousei; e as vozes se calaram atentas.
- Sim!
- "Os Intrusos", não é???
- Sim!- Houve uma expectativa em torno da minha interrupção.
- Vocês planejam colocar a figura de um monstro rasgando a capa do CD e saltando para
fora do mesmo?
- É.- Se inclinaram para frente.
- Acho essa idéia meio batida, que tal algo mais sofisticado e original?
- Como o quê?
Abri um sorriso perto do cínico e disse:
- Um homem deitado, pronto para fazer seu exame de próstata!
E as gargantas liberaram as mais selvagens gargalhadas, e logo que as lágrimas deixaram de escorrer dos olhos divertidos um dos amigos do amigo me disse:
- Isso é que é ser intruso!!!Há,há,há!!! Ei amigo; você é engraçado; por acaso toca algum instrumento???
Anderson Dias Cardoso.
boca cheia; nada de importante apenas a diversão pós aula de sempre.
Interrompidos pela chegada de um amigo e seus novos amigos (coisa que faz parte da natural desagregação de fim do colegial) resolvemos os convidar a tomar assento.
Dessa reunião dois grupos de diálogo se formam, mas água e azeite novamente se repelem; um deles, meio constrangido silencia; e o recém chegado se empolga comentando os projetos musicais da banda que ameaça a se formar.
Eu tento falar ao amigo, mas os amigos do amigo eram mais ilustres e minha voz soou fraca
então preferi o silêncio!
A conversa atingiu o ponto do planejamento da capa do CD e as idéias (muito primárias por
sinal!) foram lançadas para a votação, e das melhores sacaram a tradicional proposta da
figura do monstro!
Monstro devorando, monstro no cemitério, monstro e mulheres nuas, monstro rasgando a capa do CD e saltando para fora...E enquanto decidiam a fonte e localização geográfica da mesma no CD eu pude escutar o nome da banda: "The Intruders"!!!
A negociação se desenvolvia empolgadíssima, e uma idéia me veio à mente, e desejei tomar parte da conversa:
- A banda se chama "The Intruders"?- Ousei; e as vozes se calaram atentas.
- Sim!
- "Os Intrusos", não é???
- Sim!- Houve uma expectativa em torno da minha interrupção.
- Vocês planejam colocar a figura de um monstro rasgando a capa do CD e saltando para
fora do mesmo?
- É.- Se inclinaram para frente.
- Acho essa idéia meio batida, que tal algo mais sofisticado e original?
- Como o quê?
Abri um sorriso perto do cínico e disse:
- Um homem deitado, pronto para fazer seu exame de próstata!
E as gargantas liberaram as mais selvagens gargalhadas, e logo que as lágrimas deixaram de escorrer dos olhos divertidos um dos amigos do amigo me disse:
- Isso é que é ser intruso!!!Há,há,há!!! Ei amigo; você é engraçado; por acaso toca algum instrumento???
Anderson Dias Cardoso.
domingo, 27 de fevereiro de 2011
Adotados Nascem dos Sonhos.
Quando o espelho lhe começou a contar a verdade a respeito de seus cabelos encaracolados
e olhos negros em uma família de madeixas escorridas e olhos claros; quando a idade
começou a lhe clarear a mente ela correu para os braços paternos e interrogou sua
procedência.
Era filha do vácuo?A cria da rejeição ainda nos braços procurou os caminhos de seu
itinerário!
Filha de quem?Deixada por quê???E as perguntas se avolumavam junto à angústia de se
descobrir estranha ao seu passado e procurou se esconder ainda mais sob os braços do pai
que não era pai, e sentiu falta da mãe que não era mãe e que cumpria horário numa
importante reunião.
Do abraço o pai se afastou um pouco, e as mãos fortes se ofereceram às delicadas, e de
joelhos se nivelou ao olhar triste; e ela, agora arisca negou a carícia.
Não sou filha, não vim daquele ventre amado era o que as frases imaturas tentavam
explicar, e ainda outras tantas tumultuavam se na boca miúda.
Mas os olhos do pai se esqueceram dessa dor empática quando lhe brilhou uma estória à
mente, e um sorriso foi o início da cura!
-Você é minha filha sim; mas não nasceu da barriga da mamãe! A criança, confusa e
surpresa interrompeu o choro e se apegou a possibilidade de uma redenção.
-De onde eu nasci?
-Houve um tempo onde não entendíamos o mundo então inventávamos vários deuses que com suas vidas se explicavam todos os mistérios, e desses
um foi Zeus, o pai dos deuses, e dele e Métis, a deusa da prudência nasceu Atênas, a
deusa da sabedoria!
Os olhos vermelhos de choro começaram a se transmutar e gradativamente começaram a
refletir segurança, e ela implorou por continuação.
-Ela não teve um nascimento normal, ou fácil, ou mesmo convencional!Ela não foi gerada no
útero de Métis, mas na cabeça de Zeus!!!
A criança suspirou admirada, mas o pai não ofereceu trégua à sua curiosidade:
-A cabeça daquele poderoso deus doeu com as dores do parto, e o pai gritava tais dores e
deu à luz, com a ajuda de seu filho Hefesto sua linda filha veio ao mundo e foi a mais
sábia, e amada por seu pai, que a fez seu braço direito!
A criança olhou-o sem entender, mas ele, ainda com o sorriso brilhando nos lábios
completou sua estória:
-Você nasceu, assim como aquela deusa! Nasceu na minha mente ainda antes de nascer!Nasceu
dos sonhos em que eu a imaginava com os mesmos olhos escuros e cabelos crespos!E esse seu
sorriso era minha delícia, e eu esperei tantos anos por esses seus abraços!Eu sonhei
você, e sofri por cada dia que esteve longe de mim, e procurei por esse sonho até que a
encontrei, esse sonho que era você...minha filha!
Dai então o pequeno coração se aquietou, se abriu a receber todo aquele amor pois não se
compreendia mais como um descarte, mas como presente.
Anderson Dias Cardoso.
e olhos negros em uma família de madeixas escorridas e olhos claros; quando a idade
começou a lhe clarear a mente ela correu para os braços paternos e interrogou sua
procedência.
Era filha do vácuo?A cria da rejeição ainda nos braços procurou os caminhos de seu
itinerário!
Filha de quem?Deixada por quê???E as perguntas se avolumavam junto à angústia de se
descobrir estranha ao seu passado e procurou se esconder ainda mais sob os braços do pai
que não era pai, e sentiu falta da mãe que não era mãe e que cumpria horário numa
importante reunião.
Do abraço o pai se afastou um pouco, e as mãos fortes se ofereceram às delicadas, e de
joelhos se nivelou ao olhar triste; e ela, agora arisca negou a carícia.
Não sou filha, não vim daquele ventre amado era o que as frases imaturas tentavam
explicar, e ainda outras tantas tumultuavam se na boca miúda.
Mas os olhos do pai se esqueceram dessa dor empática quando lhe brilhou uma estória à
mente, e um sorriso foi o início da cura!
-Você é minha filha sim; mas não nasceu da barriga da mamãe! A criança, confusa e
surpresa interrompeu o choro e se apegou a possibilidade de uma redenção.
-De onde eu nasci?
-Houve um tempo onde não entendíamos o mundo então inventávamos vários deuses que com suas vidas se explicavam todos os mistérios, e desses
um foi Zeus, o pai dos deuses, e dele e Métis, a deusa da prudência nasceu Atênas, a
deusa da sabedoria!
Os olhos vermelhos de choro começaram a se transmutar e gradativamente começaram a
refletir segurança, e ela implorou por continuação.
-Ela não teve um nascimento normal, ou fácil, ou mesmo convencional!Ela não foi gerada no
útero de Métis, mas na cabeça de Zeus!!!
A criança suspirou admirada, mas o pai não ofereceu trégua à sua curiosidade:
-A cabeça daquele poderoso deus doeu com as dores do parto, e o pai gritava tais dores e
deu à luz, com a ajuda de seu filho Hefesto sua linda filha veio ao mundo e foi a mais
sábia, e amada por seu pai, que a fez seu braço direito!
A criança olhou-o sem entender, mas ele, ainda com o sorriso brilhando nos lábios
completou sua estória:
-Você nasceu, assim como aquela deusa! Nasceu na minha mente ainda antes de nascer!Nasceu
dos sonhos em que eu a imaginava com os mesmos olhos escuros e cabelos crespos!E esse seu
sorriso era minha delícia, e eu esperei tantos anos por esses seus abraços!Eu sonhei
você, e sofri por cada dia que esteve longe de mim, e procurei por esse sonho até que a
encontrei, esse sonho que era você...minha filha!
Dai então o pequeno coração se aquietou, se abriu a receber todo aquele amor pois não se
compreendia mais como um descarte, mas como presente.
Anderson Dias Cardoso.
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