Manquejava de uma perna, um defeito herdado e compartilhado
por irmão e irmã; vestia à moda meio grunge-punk, com jaqueta camuflada,
camiseta preta de banda e calça rasgada estrategicamente nos joelhos. O
acompanhava a figura magra e bem semelhante de seu assecla.
Ignoro as anteriores conversas, e, passado tanto tempo de
que ouvi a seguinte me falham algumas lembranças; mas sei que passeavam por
algum ajuntamento, e participavam de qualquer show gratuito quando a
necessidade fez ser interrompida a conversa.
Ele abordou um dos passantes:
-E aí!
-E aí!-Me contaram que o garoto se vestia bem, e lhes
pareceu simpático!
-Meu nome é Beiço, e não queria te incomodar, mas... Sabe,
eu esqueci minha carteira em casa, e tô morrendo de vontade de um pito!Cê não
tem um real aí pra me emprestar pra eu comprar um cigarro picado não?
O garoto respondeu prontamente vasculhando os bolsos, e,
tirando a carteira grossa verificou suas notas para lhe entregar o pedido.
-Olha, eu só tenho dez reais aqui...
-Pode deixar mermão, eu vou ali no boteco, compro o pito e
te trago o troco!
-Tudo bem!-Confirmou o solidário com um sorriso- Eu vou ficar
por aqui mesmo, tô vendo se encontro algum dos meus amigos...
A história se seguiu mais ou menos como na conversa, e eles
logo saiam da vendinha por uma rota um pouco diferente da anunciada, com um
maço de cigarros e uma lata de cerveja em mãos.
-Ué “Beiço”, cê não vai lá devolver o troco do moleque
não?Ele ta esperando!O cara foi mó de boa contigo e você vai dar o tombo nele?
-Na verdade eu to fazendo um grande favor pra ele não
devolvendo essa grana, Ronaldo!Tô ensinando que não se deve confiar em ninguém!
Anderson Dias Cardoso.