Com o rapto de sua criança provou viver em ambientes
fragmentados, com imagens de seu apego brincando com seus relances.
Os pensamentos se viciaram, e apesar do esforço teimavam em
lembrar a falta.
As mãos só se estabilizavam segurando alguma coisa, e toda
conversa garantia uma risadinha nervosa, de cantos espumantes e olhos
apertados.
O segundo dia não amenizou os nervosismos. Foi atacado de
refluxos, alterações de pressão, vertigem... Vomitou duas ou três vezes o que
não havia comido.
O terceiro dia permitiu-lhe quase meia hora de esquecimento,
quando a parentada ausente, porém querida, se solidarizou o suficiente para uma
visita, e alguns abraços regados por lágrimas sinceras.
O quarto dia começou com o corpo se diluindo em dores de
stresse, e a obrigação impiedosa de seu serviço requisitando seus frangalhos.
No quinto dia não houve ainda nenhum boato, e o coração já
se encaminhava discretamente ao consolo da perda.
No sexto dia se permitiu sair mais cedo, visitou simbolicamente,
em um cemitério a figura mais semelhante ao perdido, e perfumou lhe um vaso
decadente com a vermelhidão sofrida de duas dúzias de rosas.
No oitavo dia houve a convicção da morte, e ele guardou um
luto estóico, mais leve e palatável!
Era homem muito equilibrado, nada insensível!
O nono dia foi dia de fuga, e, dois dias depois a criança
esfarrapada esmurrava as portas do pai...
Era tal qual uma ressurreição; e o coração dos homens não
sabe bem receber os mortos...
O pimpolho foi fantasma desacorçoado até que o pai o
entendeu vivo, uns tantos dias depois!
Anderson Dias Cardoso.