sábado, 16 de junho de 2012

Gula...


Repetia o mesmo caminho, pacífico e cheio de apetites, rumo à uma certa intoxicação brutal de condimentos e embutidos, respingantes de toda gordura do mundo!
Era rapaz orgulhoso de seu bom funcionamento visceral, mesmo sendo derrotado vez ou outra por supra-dosagens de consumo, resultando em reboliços estomacais e gazes inconvenientemente doloridos e mal cheirosos!
Pediu um “TUDO”, daqueles sem demagogia, e ao desbastar o potente com umas primeiras dentadas esfomeadas teve seu interesse reduzido à indiferença, logo, ao desconforto, e daí só restava o desafio de aplanar a montanha calórica e ver sendo conferido à si mesmo às honras estupidamente vergonhosas de glutão.
Era verdadeiramente um idiota que causava espanto!
Em sua pós-fartura preparou o organismo com as medicinas caseiras e envelopes de antiácidos para as turbulências e tempestades estomacais que se projetavam com todas as sombras e maus presságios.
Quando dormiu, o fez preocupado com outros incômodos, já que o alimento se assentara bem no ventre em nada se convulsionando!
E, como de costume, o que o despertou foi a acidez do refluxo, e uma vez desperto tossiu até lacrimejar os olhos sonolentos, forçado pelas composições de seus sucos estomacais.
Acordou um ou outro, mas logo que se calavam os ruídos o sono abatia os e o cuidado à contra gosto se perdia na sonsidão dos quase acordados!
Sofreu então, merecidamente sozinho aquela noite inteira, se revolvendo e consumindo o que prometesse alívio às manifestações de sua fisiologia agredida!
Pela manhã recusou tudo, menos o café preto, companheiro e calmante da ressaca de seu vício não alcoólico.
Recusou almoço, e continuava sentir seus processos causando lhe insurreições ácidas e enjôos cíclicos, até que a consciência da degradação das proteínas em seu interior provocavam, com suas fermentações a erupção e eructações pestilentas típicas, caracterizando odores de carne putrefata!
Sentiu ânsias à cada arroto, e as impressões e a certeza de carregar retalhos de cadáveres em seu ventre...
Pensou consigo mesmo, outra vez:
-Gostaria sinceramente de viver das plantas, mas como se diz por ai:
-A carne é “meu fraco!”

Anderson Dias Cardoso.

quinta-feira, 14 de junho de 2012

Quando Nos Abandona a Conciência...

Então o Grilo continuava ali, amuado, recusando conselho ou palavra.
Deixara o adjetivo que seguia seu nome se tornar em mero sobrenome, como qualquer Silva, e se acompanhava o garoto graveto era com desprazer, uma teima resquicial de um sentimento de dever ainda evocada pela insistência de não negar-se a si mesmo.
O garoto havia se vendido, e cresceram-lhe orelhas, rabo, dentes de asno e, de suas mentiras o nariz se estendia de palmo em palmo até tornar-se em carvalho e subjugar como vulgar apêndice a pequenez do corpo esculpido.
Não só por mais uma vez ele implorou por orientação, mas as disposições do Grilo eram de silêncio...
O Grilo falara por muito tempo, agora as obstinações do crescido boneco o haviam lhe roubado os cuidados e o afeto, e deviam ser o guia que o encaminharia o restante do caminho...
A consciência permaneceu até a decomposição dolorosa do projeto humano sob a potência agigantada de seus erros; depois, partiu pra encontrar quem verdadeiramente prezasse sua companhia!  

Anderson Dias Cardoso.

domingo, 10 de junho de 2012

A Dignidade Deve Ser Mantida.


Não concordava, ou se adaptava ao culto do animal sem porte, de orelhas demasiadamente longas e que suportava sobre si as cargas não aceitas pela dignidade, ou potência das outras bestas.
Debatia entre seus pares as associações feitas ao seu povo como o “povo dos jegues”, e ressentia-se muito das vergonhosas apresentações e “rallys”, que eram televisionadas, com toda cena de ridículo e apresentação de hematomas e contusões.
Nascera nordestino amargo, e lutara desde sua infância para dissociar sua terra do animal sem propaganda digna e, em um de seus projetos importou outro animal de terras secas, muito mais apresentáveis e sisudas, e desfilou sobre os paralelepípedos empoeirados a monstruosidade castanha que vivia antes em outros desertos.
-Nunca se viu propagandas de jegues em produtos de renome, mas sim em infames aguardentes e outros preparados, ou em apelidos e brincadeiras de má impressão!
-Olhem, meus conterrâneos como se alteia este cupim!Que pelagem respeitosa e que pernas fortíssimas! Era à este animal gracioso que nosso povo deveria ser associado!
Foi daí que se desenvolveu campanhas de promoção, e importações de espécimes para  povoar o cenário, e refazer a imagem do povo aos olhos preconceituosos de outros estados!
A praça tornou-se em local de comício, e, no ajuntamento decidiam seu futuro iconográfico.
-Mudaremos a bandeira municipal nesta figura, logo propagaremos nossa nova identidade em todo nosso território!
-Cigarros, bebidas finas, bolsas, e outros produtos dignos já figuram nosso emblema, e agora a representação de nossas virtudes! Seremos conhecidos como o povo do camelo!
Então, uma voz de transição das fases de maturidade sussurrou em meio ao burburinho:
-Não é camelo, é dromedário! Camelo tem duas corcovas!
A multidão se dispersou encabulada, um colegial havia desfeito todo um sonho de revolução de paradigmas!

Anderson Dias Cardoso.
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