Negou-se a abraçar o filho morto, e a residente se manteve ali,
com o pescoçinho e bracinhos pendendo comoventemente sob um abraço desajeitado
de alguém que força a entrega do que não quer ser recebido!
-Tirem essa criança daqui!Eu não quero ver o rosto!Tirem
esse maldito morto daqui!- A voz acompanhava o modular do choro, engasgava, se
repetia enquanto a garota era arrastada do catatonismo de sua surpresa por
profissionais mais experientes, sendo levada ao corriqueiro círculo de curiosos
ávidos por reconhecer o motivo da histeria de mais uma mãe.
-A criança morreu, e ela disse que não; pediu que jogasse o
corpinho no container de lixo hospitalar e logo começou a gritar comigo daquela
forma!- o copo de água açucarada pendia sobre a displicência dos dedos; sustos
e pequenas surpresas não careciam de tanto cuidado, mas situações como aquelas
sempre rendiam interessantes conversas de intervalo.
A mãe voltou à normalidade quotidiana, amparada pela pensão
deixada por pai militar, e logo visitava, em uniformes hospitalares, um e outro
hospital, levando sempre consigo uma criança furtada e mudando-se sempre que a
calma da cidade residente lhe fizesse vítima de suspeita.
Felizmente as notícias caminhavam mais lentas nas capitais
em 1977!
E então ela podia embalar sempre um novo filho, sussurrando
nomes aleatórios; banhar a criança sem olhar o sexo, e vestir de azul ou rosa,
de acordo com seus humores!
Os rituais da maternidade a entretinham por alguns dias, até
notar a descaracterização de recém-nascido, então era hora de procurar outro
filho para a permuta.
E aos 73 anos Elisabeth sugava seu seio esquerdo, murcho e dolorido...
Ela chorava de fome!
Amanhã seria Pedro, ou Rebeca ...
Anderson Dias Cardoso.