Alugara um quarto, em uma pensão de pouco prestígio e era visto
vez em quando, visitando a peça.
Exigira aos proprietários que o espaço permanecesse
hermético, livre até mesmo de qualquer propaganda ou impressos vinculados ao
seu nome, e havia removido, antes da mudança, cada móvel.
Caiou as paredes com um branco, assim como as janelas, e
iluminou os ambientes com a fluorescência fria de lâmpadas de baixo consumo,
fazendo sumir os limites do lugar.
Em seus dias de mistérios eram trazidas sacolas e quando a
porta o abandonava à solidão desejada se despia do peso das roupas, se ligava à
bolsa de colostomia e introduzia os cateteres de soro para hidratação e se
estendia como a árvore que acreditava ser, tendo por penduricalhos os tais
recipientes de suporte.
Então a vida passava de sua celeridade para uma calma
reconfortante, e ele sorvia intravenosamente o líquido e minerais próprios ao
seu corpo misto, e ia realizando seus processos fotossintéticos com a
artificialidade da lâmpada elétrica até que o incômodo de um alarme o
despertava de suas contribuições ecológicas; e ele voltava à sua agitação
móvel!
-Prefiro ser carvalho!-Dizia-se quando descia as precárias
escadas, e lidava com o desprezo disfarçado de seus anfitriões.
Como passava por um período de ócio visitou seu espaço na
semana seguinte, e ouviu buchichos; nas outras notou o incômodo e irritação dos
circundantes e então preferiu subir apressado os lances para se fugir de
qualquer hostilidade.
Já no abafamento do cômodo, se dissolveu na brancura do seu
momento e aprofundou-se em suas trocas ambientais até que a incandescência do
ambiente exterior rompeu a harmonia de sua comunhão.
Ele relutou-se em abrir seus olhos, naquele universo íntimo
preferia se utilizar sinestesicamente de seus outros sentidos; esperou então
que os passos pesados estivessem bem próximos para se assustar com a estranheza
da cena.
Eis que tentavam pairar uma trinca de beija-flores de uns
150 quilos, de cara empoada e asas mirradas e uma paleta estroboscópica de
cores, tanto nos olhos quanto nos vestidos, dançando convulsionadamente em
torno de seu tronco e galhos!
Era repugnante ver homens de meia idade se prestar à tamanho
ridículo para obrigarem o abandono da propriedade!
Recolheu, nauseado, o pouco que sempre trazia consigo e
partiu, tendo em mente o aluguel de alguma casa de campo e paisagens
bucólicas...
-Realmente, as cidades são hostis às árvores!
Anderson Dias Cardoso.
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