quinta-feira, 5 de maio de 2011

A Culpa.


No terminal esperávamos que o motorista desse partida num ônibus lotado onde nem janelas abertas aliviavam o calor.
Minha esposa reclamava muito do caro descaso da passagem para a humilhação do tratamento, da espera de mais ou menos 45 minutos... Outros reclamavam nesta mesma indignação.
Trocamos de veículo para que o lavassem, e ainda esperamos parecendo esquecidos pela empresa, e dos irritados; um senhor soltava alguns palavrões intermitentes, dos quais o fluxo foi aumentando gradualmente até que o ônibus se pôs a caminho, e ainda, além disso.
O volume dos protestos elevou-se ainda e alguns risos e cochichos vieram a revelar a deficiência do reclamante, a algumas censuras debochadas divertiam os passageiros.
A cabeça se movia de um lado ao outro, as mãos seguravam um cobertor e uma sacola amarela com esquisitices; impropérios jorravam dos lábios como uma cantiga profana, maldições que filtradas pelo humor se tornavam riso.
Um grupo de amigos sentados ao fundo eram os que mais se divertiam com os insultos do louco, e um deles alertou os para que prestassem atenção à reação do homem, e ao descer em seu ponto chegou próximo à porta e gritou:
-Oh, Jacaré!
Houve um grito raivoso e o pobre se levantou amaldiçoando e procurando de quem procedia o insulto.
Gargalhadas maldosas, e o apelido ecoou em umas tantas vozes, que procuravam dissimular sua localização!Quase todos contribuíram para aquela ira; deliciados.
O louco encarava um e outro, e ameaçava com socos no ar, mas as vozes não se calavam!
-Jacaré!Oh, Jacaré!Jacaré!Jacaré... Riam e provocavam!
Um rapaz foi descoberto pelo ultrajado, foi xingado em particular, recebeu alguns chutes aos quais fez parar com ameaças, vigor juvenil e uma massa corpórea maior.
O homem se afastou, voltando ao seu banco, e o garoto implicou mais uma vez!
-Oh, Jacaré!
O homem veio num repente e saltou no próximo ponto, e todos riram vitoriosos!
Enquanto desciam uns outros, alguém percebeu a carreira do louco, e gritou enquanto uma pedra de quase um quilo atravessava dois vidros quase atingindo uma das almas que se guardou de humilhar o pobre homem!
Os gritos substituíram os risos, e avisaram que outra pedra já chegava... Os corpos se movimentaram procurando escape; cada qual escondendo-se covardemente atrás do corpo mais próximo!

O ônibus fora abandonado pelo motorista, que se desculpava e se explicava pelo celular aos seus superiores; as portas cerradas nos limitavam na mira das pedras e os gritos dos desesperados pediam que seguíssemos o caminho para longe do perigo.
 O motorista finalmente atendeu e uma enxurrada de desesperados alcançou a rua já limpando as lágrimas e se afastando do ônibus, que agora era o alvo imóvel da saraivada.
A cobradora inquiria quem era o culpado, e o último dos provocadores foi apontado, e os mais sensatos disseram que quase todos participaram daquele espetáculo triste...
O cobrador havia se afastado muito, corria atrás do louco que capengava entre os carros em movimento...
A culpa corria com a loucura daquele homem ou se dissimulava nos jovens que se afastavam discretamente até se esconder da visão?
Afinal, de quem foi a responsabilidade???

Anderson Dias Cardoso.


2 comentários:

Vampira Dea disse...

O Descaso, o incomodo, e a bagunça, de quem é a culpa/ Só pode ser do Jacaré.
Beijinhos

Anônimo disse...

Perfeição de texto, amigo Anderson. Parabéns. Estive ontem aí em Anápolis. Abração amigo.

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