sábado, 11 de agosto de 2012

"Gênesis Segundo Dorival Caymmi."-Reformatado!


...Bom, na verdade no sétimo dia Deus formou o "baiano", o constituindo como a coroa de sua criação, e, contemplando a interação de casais entre as animálias notou que Dorival Caymmi estava sozinho, porém, ele mesmo nada percebeu! Abriu os olhos, espreguiçou-se, e fechou os novamente voltando a vegetar.
Então Deus extraiu lhe uma costela; a qual foi notada a falta muito tempo depois, mais ou menos quando já contavam 732 primaveras!
E Ele lhe formou uma mulher que lhe correspondesse; desde aspectos fisiológicos quanto intelectuais, e o próprio Deus lhe deu um nome:
Adelaide!-pois seu adjuntor ainda ressonava sobre a relva muito verde.
Deus estava começando a achar aquilo muito chato, e, ao contrário das sentenças anteriores -"Viu que tudo o que criara era muito bom"-pensou:
"É, dessa vez não deu!”. E meio contrariado colocou o casal de pé, espremeu uma pequena nuvem carregada sobre suas cabeças para tentar lhes despertar os ânimos; e lhes plantou um belo jardim para lhes inspirar, ainda, oferecer comida, e outros recursos necessários, e os incumbiu de cultivá-lo e expandir; porém Dorival reclamou da altura das árvores frutíferas!
Achava cansativo ter que erguer tanto os braços para apanhar alguma coisa para comer; mas Deus se fez de surdo, e continuou a lhes explicar suas funções como zeladores do Éden.
Dorival seria uma espécie de gerente executivo, e sua esposa o auxiliaria.
Dorival criticou mais algumas vezes a respeito do tamanho daquele jardim. Na sua opinião uma só árvore frutífera, que fagocitasse todos seus detritos, que tivesse uma boa
sombra, e um riozinho correndo manso ao lado já lhes bastavam. Não carecia todo aquele trabalho só por eles, ou melhor, não carecia todo aquele trabalho só para eles, e se "Ele" prestasse um pouquinho mais de atenção, logisticamente falando, notaria que as zonas que requeriam mais cuidado ficavam muito espaçadas umas das outras!!!
Então Deus começou a se despedir, dizendo que ia dar uma checada na distância entre o sol e a terra, pois toda aquela preguiça só podia ser culpa do clima, e afastou se por algum tempo enquanto Dorival escolhia uma árvore frondosa para se esticar-Aquela conversa toda o deixara exausto!E passando a ouvir o gorjear alegre dos passarinhos, os sons das águas, os barulhos do mundo, e nesse ritmo começou a vocalizar algumas
palavras. Encantou-se de como aqueles aglomerados sonoros se completavam harmonicamente, e faziam tudo soar tão bonito. Era uma canção que falava das belezas do paraíso!
Seu coração se inundou de satisfação, pois havia descoberto que este exercício o agradava muito, e que ainda podia o executar deitado!
Eufórico e maravilhado Dorival a repetiu algumas vezes, muito corretamente, e outras não!Algumas palavras começaram a se tornar obscuras, lhe fugindo da mente. Ele fez beicinho, e pensou se poderia arranjar algum jeito de registrá-la!
Primeiramente notou bem como sua alma processava e guardava as informações. Era dito uma palavra, lhe vinha uma imagem à mente, então, se ele criasse algo correspondente àquela figura, na forma de um signo reconhecível, ficaria tudo fácil.Ele sorriu consigo de sua astúcia!
Só necessitava de uma pedra afiada; e eis que bem ao lado havia uma!
O homem esticou o braço e tentou apanhá-la, porém estava um pouco além de sua envergadura. Percebeu que nunca a alcançaria, e franziu o cenho novamente.
Assim se perdeu a primeira composição do primeiro homem...
Aquilo não devia acontecer de novo; e Dorival cogitou como
poderia resolver aquela situação dramática com o mínimo dispêndio de
energia!
Pensou, pensou, tirou um cochilo, pensou de novo e se deu satisfeito pela solução que lhe caiu no entendimento. Então gritou por sua esposa, mas esta demorou alguns minutos. Ele bronqueou um pouco, e, depois de resolvida a situação, gentilmente pediu que lhe apanhasse aquela pedra!A tão desejada pedra!
Ela raciocinou uns instantes, sua face ruborizou um tanto e ela começou a gritar que não era empregada, que cuidava sozinha do jardim e que ele ficava ali deitado o dia inteiro sem fazer nada. Disse que a responsabilidade tinha sido dada aos dois, e aproveitou para colocar os "pingos nos is" .
E esta foi uma proto-discussão de relação; onde foram acertados os papeis de cada um deles, numa divisão mais ou menos justa das funções, e Dorival saiu deveras nervoso para tomar conta da parte que lhe cabia, e aparar alguns galhos da árvore do conhecimento do bem e do mal.
A árvore realmente era muito bela; achou que não precisava de nenhum retoque!Não suportava aquela mania de perfeição da mulher!
Não havia nada há fazer ali; então, resolveu tirar uma pestana para não dar por perdido toda aquela caminhada. Se recostou e cochilou por alguns minutos, mas aquela voz o fez sobressaltar
Este pensou-"lascou, me descobriram!!!"- Mas, olhando direito notou aquela forma esguia e longilínea que escorria graciosamente pelo tronco da árvore, então reconheceu a serpente.
-Bela árvore, não acha?-Disse a serpente admirada!
-Sim muito bonita... Acho que é uma das coisas mais bonitas que alguma vez vi, e olha que nem precisei aparar... -disse Dorival meio envergonhado.
-Você já provou do seu fruto?É também o mais delicioso!Deus não lhe
disse que provasse de todas as árvores?
-Pra falar a verdade ele disse que se comêssemos ia dar morte!
-Nada disso bobinho, Ele diz isso, pois sabe que no dia que vocês comerem do fruto dessa árvore seus olhos se abrirão e vocês serão como Deus, conhecedores do bem e do mal!!!
-Olha, na realidade eu prefiro meus olhos fechados mesmo, o meu maior prazer é dormir; e quanto a ser como Deus; esse ponto é o menos atrativo ainda!Ele trabalha demais!
A serpente “torceu o bico”, deu mais algumas voltas no tronco daquela árvore, suas feições se enterneceram novamente e ela disse:
-Se você comer essa fruta não vai mais ter que trabalhar!!!
-É mais ou menos como se você tivesse pedindo demissão, e sem aviso prévio!E, na pior das hipóteses a morte é o descanso eterno!!!
Dorival se animou e comeu logo umas cinco, e levou uma para sua esposa; mas o tiro saiu pela culatra!
 Deus ao voltar os encontrou escondidos de vergonha. Ao os inquirir descobriu a desobediência do homem; e o condenou a ganhar seu sustento com o suor de seu rosto, sujeito à todas as vicissitudes de uma vida independente da vontade soberana.
E à mulher, Deus permitiu um paradoxo entre a vontade de subjugar seu marido, e uma certa subserviência. Uma dependência afetiva, além de o parto lhe ser dolorido à partir daquele momento.
É claro que Dorival se sentiu o mais injustiçado!Ter que trabalhar tanto antes do descanso da morte era muito desagradável.
Após alguns anos tiveram três filhos. Dori, Danilo, e Nana; e desenvolveram um sistema revolucionário de coleta e grãos e armazenamento para os invernos rigorosos. Era uma espécie de rodízio em que a cada ano um coletava os alimentos e os outros quatro descansavam.
Pode até parecer meio sacrificante, mas dava a possibilidade de ficar à toa por quatro anos inteiros!
No ano de 799 a partir da criação do homem, vez da coleta de Dorival, este alegou uma indisposição crônica; que passou subitamente no fim do período laboral, e todos notaram a artimanha do patriarca e se indispuseram contra ele.
Orgulhosos que eram não coletaram mais cereais...
No ano seguinte foi extinta a raça humana...
Deus havia criado toda uma estrutura para servir de suporte à vida do homem; o havia amado, e achou um desperdício ter que desmontar toda aquela armação cósmica, e, como seu citado amor era demais abundante, precisou extravasar!
Resolveu recriar o mundo, e o povoar novamente, assim como um novo casal.
Mas dessa vez no sexto dia!
Seus nomes foram Adão; e sua mulher Eva...

Anderson Dias Cardoso. 

quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Demagogia Artística!

Retornou para sua cidadezinha trazendo consigo uma semi-derrota.
Alugou com dinheiro alheio a casa de sempre, instalou a mobília surrada, acomodou sua frustração ao exíguo espaço e, não pôde recusar as insistências da solidão e seu inquilinato dolorido!
Rascunhava estórias bobas para se entorpecer em uns modestos devaneios tortos, gozando de coquetéis de analgésicos para as dores reumáticas, e do café forte; o único sabor que lhe despertava lembranças!
A aposentadoria nunca foi suficiente; e então, com o poder das frases feitas se empregou em adornar por dinheiro a morte, com epitáfios bem convincentes, ao menos às posteridades desavisadas.
Os corpos desciam às dúzias à cova, tranquilamente honrados pelo parágrafo comprado, uma dignidade sem méritos.
Aventurou-se também em compor discursos; e descobriu que sua literatura absurda elegia candidatos, emocionava, ainda que sendo reconhecidas demagogias; pois suas palavras fluíam agradabilíssimas, tal qual poesia aos ouvidos nobres!
A mentira, às vezes é dignificada pela sutileza da encomenda; e o autor quase sempre chora junto ao povo, enquanto aplaude...
E esse é um derradeiro desconsolo:
Seu dom será a miséria alheia!

Anderson Dias Cardoso.

domingo, 5 de agosto de 2012

Vizinhos, Uma História Real!

Morava num daqueles aglomerados de barracões; quatro famílias dividindo o espaço de um lote e, enquanto minha esposa viajava em visita aos familiares eu era daquelas sombras submetidas ao capitalismo, chegando sempre tarde em casa, me resguardando discretamente de qualquer interação social, de acordo com minhas antipatias e fobias por interações desnecessárias!
Se alguma coisa denunciava-me a presença, isso era uma luz filtrada pela cortina improvisada e alguns resmungos da TV, ou o computador; quem me fazia companhia cantando um playlist repetitivo, que ofereciam mais distração do que prazer.
Era um tédio confinado que muito me agradava, e, se houvesse sabedoria para antecipar imprevistos, e dinheiro suficiente para me preparar o necessário eu não deixaria meus portões por nada que não fosse a visita à casa materna!
E até meu pet era uma gata negra, a qual eu brincava ser amuleto para evitar os supersticiosos, e esta era uma preferência pois, assim como eu, apreciava muito o silêncio!
Não fosse a gata, certamente seria um peixe dourado!
Sempre, sempre fora assim, daqueles que guardam suas cacofonias, brusquidões de movimento e atitudes para os períodos de ausência dos que poderiam se incomodar!Era um ninja condômino, de chegadas e saídas discretas, e nenhum ruído, ao não ser o sussurrar e um repentino estralo de parada da centrifuga!
Passei por toda ausência quase sem encontros, e mesmo nestes, era cortês segundo os protocolos; mantive minha discrição até a chegada da esposa!
A recebi alegremente, orgulhoso do meu proceder impecável, apenas para ver feridos os meus brios pelo deboche da amada; que me disse que a vizinha espalhara que ela pouco me cuidou, e que, em sua piedade ela me atendeu, quando eu lhe bati a porta pedindo pão!
Daí percebi, nenhuma reputação resiste à uma boa vizinhança!

Anderson Dias Cardoso.
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