sexta-feira, 13 de agosto de 2010

O Estranho Destino do Coelho da Páscoa.


Dia 5 de abril de 2010, a tv murmurava naquela sala aquecida
algumas notícias irrelevantes, e o vinho escorria adocicado garganta
abaixo, e Noel sentia um pouquinho de sono, sentia se um pouco
deprimido, e chateado com as manifestações de alguns duendes
revindicando melhores condições de trabalho, e um aumento salarial de
pelo menos 5% e adicional de insalubridade, e ainda Toine, a única rena
do sexo feminino resolveu aposentar se deixando o ainda mais solitário.
O fogo da lareira já ia se apagando, e o vinho tinha se acabado e o
jornal agora apontava um acréscimo de cerca de 30% nas vendas e a Páscoa estava começando a se
aproximar em importância de feriados mais comerciais como o dia das mães e o
"Natal"...Os olhos de Noel interromperam uma piscadela quando a palavra
foi pronunciada, e seu coração começou a se angustiar, então sentiu
ciúmes, ou mesmo ódio daquele feriado e todos seus ícones
representativos, e saiu louco pela noite fria chorando magoado
por se sentir cada vez mais deixado de lado, e enquanto andava pela rua
8 contemplava as divisões das classes na enorme gama de papéis de
embrulho dos ovos de Páscoa, que variavam de tranparências e fitas de
seda até papéis mais rústicos daqueles ovos simbólicos que eram dados
quase com tristeza à prole menos afortunada. As luzes incomodávam um
pouco, e os pensamentos estavam ainda meio turvos, e uma loucura ainda
maior lhe veio à cabeça: um ataque iconoclasta seria lembrado para
sempre, se fosse executado com a mais pura brutalidade talvez as
pessoas pudessem desenvolver alguma fobia correlacionada ao feriado, e
se lembrariam daquele corpo felpudo estendido na sarjeta, banhado em
sangue, então a Páscoa seria repulsiva à todos; estava tudo decidido, o
Coelhinho devia morrer!!! Antes de tudo tinha que vencer seu pavor de
sangue, e o alcóol começava a se rarefazer na corrente sanguinea, então
foi à cata de mais uma garrafa de vinho; foi quando, entrou em uma
bodega e logo saiu com uma história das mais estranhas; chegou ao
balcão e pediu uma garrafa de vinho e quando a recebeu atirou algumas
moedas ao atendente e agradecido e satisfeito disse que ficasse com o
troco, porém ele retrucou com a maior falta de educação que estava
faltando dinheiro, foi quando um dentuço de cabelo ensebado lhe
completou o dinheiro, e com o sorriso o convidou para se sentar e disse
que lhe parecia conhecido mas não soube por que se ofendeu quando disse
que era o Papai Noel!!!Resolveu não julga-lo, talvez tenha sido uma criança comportada o ano
inteiro mas na noite de Natal alguém lhe teria roubado as meias ao
invés de colocar lhe um presente!!!A próxima parada seria uma loja de
armas!!! Esta ficava a mais ou menos uns três quarteirões, e estava
quase se fechando não restando ninguém além do dono; uma figura ágil e
simpática de uns 55 anos, um antigo amigo de família! Ele ergueu a
porta que já estava quase totalmente fechada e me convidou para entrar
e perguntou de que eu precisava, ele olhou algumas armas, optou por um 38
usado, nada sofisticado, mas serviria à causa, e era a única arma que o
vendedor se dispôs a vender fiado, mesmo sendo amigo da família; ainda
conversou alguns minutos, depositou a arma no balcão e foi conferir os
cartuchos, conversou mais um pouquinho e se foi!!!"Agora, rumo ao
objetivo!!!"
O ar condicinado do Shopping tinha se quebrado e aquela roupa
felpuda não lhe adiantava muita coisa, a coceira era montruosa, cruel,
assim como a vontade de fumar...o certo era que o pior de tudo era a
molecada, que ficava pedindo para pegar no rabinho encardido,
perguntando se ele botava mesmo ovinhos de chocolate...O que confortava
era que tudo estava chegando ao final, e pensando nisso resolveu mesmo
dar uma fumadinha, mesmo que isso configurasse uma quebra de contrato;
estava mesmo farto daquelas pestes, talvez se vissem o Coelhinho da
Páscoa com um cigarro falsificado nos lábios o encanto se quebrasse e o
deixassem em paz!!!
A escada rolava preguiçosa trazendo uma surpresa, o som
tranquilo do ambiênte não o tranquilizava, e não impedia que uma onda de
adrenalina o excitasse ao extremo, e então chegando ao cume, e vendo
seu odiado, uma fúria irracional lhe tomou os juízos e ele sacou a arma
, e em um impulso homicida atira............Mas nenhum corpo vai ao chão,
mas ao invés disso o coelho olha compadecido o pobre velhinho doido!!!
-Está descarregada??? Arrisca uma pergunta.
-Vixe...Hic! acho que esqueci a arma Hic! no balcão- olha meio confuso
para o indicador...estivera tão próximo de matar o vil coelho, se ao
menos tivesse uma arma...!
-Tem fósforo ai- Levou o toco de cigarro à boca.
-E você Hic! Tem uma Hic! arma ai???
-Pra quê???Afasta uma orelha que lhe caiu nos olhos.
-Pra te dar o fim que merece- diz Noel sério.
-Quem é o senhor...ou antes, por que isso?
-Hic!Papai Noel, mas pode me chamar de Noel...
-Ah sei...
-Não tem vergonha de roubar Hic! o emprego, o carinho Hic, a atenção de
um velho???
-Eu nunca faria isso...o senhor deve ter família pra cuidar...(meio sem
entender).
-Ninguém...Hic!!!Bom, tem as renas Hic! Alguns duendes mercenários mas
não contam...
_É...eu sei mais ou menos como é... eu tambem sou sozinho- se encosta
na mureta.
-O senhor Hic! não tava mentindo quando disse que nunca ia roubar meu
lugar?Hic!
-Oh!Sim (que conversa mais doida!Não estava entendendo mais nada-pensou),
claro que nunca faria isso...
Noel se aproxima cambaleando e se aninha ao lado do Coelhinho, ambos
olham absortos os enfeites no teto.
-Tá falando Hic!sério???
-Tô...
-Hic!Cê num quer um trago Hic!??? Noel estica a garrafa, e o coelho
apanha a silênciosamente e toma um longo gole.
-É duro sabe Hic!!!
-O que?(Conversar quando não se sabem os "oquês e os "Por Quês" é um
tanto difícil!).
-Hic!Ser Papai Noel Hic! Todo mundo festeja (as lágrimas já rolavam
copiosas bochechas abaixo), ganha Hic! presente e eu não...Antes d'eu
nascer não existia Papai Noel...então eu nunca ganhei presente...Hic!
-É, eu sei como é isso, eu também nunc...Bam!Bam!Bam!Bam!Bam!Bam!Bam! O
corpo do coelho tomba ainda com alguns espasmos, e dos sete orifícios
jorram filetes escarlates, e o Coelho encardido agoniza, e morre!!!
-Oh, Meu Deus!!! Meu Deus!!!Mataram no!!! Mataram o coelhinho da
Páscoa!!!A lucidez o desperta do transe alcóolico, e ele abraça o corpo
morto, e um barulho de muitos passos se perdeu no andar superior!!!
Na delegacia, aquele clima agitado e um soldado conversa desconfiado
com o delegado: Senhor...mas ele disse que é o Papai Noel...
-Pode chama lo.
A figura ensanguentada de um senhor meio obeso e de barbar brancas adentra no escritório, e
de olhos baixos ouve uma voz pedindo para que se sente; ele se senta.
-Então o senhor disse que sabe quem matou o Coelhinho da Páscoa???
-Senhor...é verdade...eu vi quem fez isso...
-Então homem, diga logo quem fez essa covardia!!!!
-O senhor pode não acreditar...mas eu vi...foram os Sete Anões!!!!

Anderson Dias Cardoso. 

domingo, 8 de agosto de 2010

O Grande Livro de Um Grande Pai.



Ele era assim, meio rústico, mas sempre com um volume massudo de capa
negra, sem letras impressas nas mãos, e sempre ressaltando a
importância dos livros na vida de uma pessoa, sempre sentado na
poltrona bem puída gostava de ao fim da tarde ler uma história para
mim. Eu adorava cada uma delas, mas a daquele pescador do Rio Negro era
a que mais me encantava! Ela dizia de um homem que ao pescar um grande
peixe, deixou cair seu filhinho naquelas águas, e nunca mais o
encontrou, era uma história moral, e seu começo dizia: "Naquele rio de
águas espelhadas em que perdi para sempre um pedaço de meu
coração...Era uma delicia, vívida, dolorosa..."As mãos calejadas
folheavam o livro, e as histórias terminavam com um sorriso, e eu
admirava meu pai, e queria me transformar em um homem culto como o
modelo que todos os dias me inspirava. Na escola minha educação cobrou
o preço de meu pai; nós não nos viamos muito, e ele cansado e castigado
pelo sol, deitava no meu colo e pedia que eu lesse uma história, e eu
apresentava meus dotes, inicialmente tímido, vacilante, e com o tempo,
seguro, orgulhoso!!!Meu pai sorria, e muitas vezes dormia de cansaço,
eu lhe beijava a testa, e ele acordava satisfeito e ai para cama, para
acordar dai à algumas horas.Eu me formei, ofereci meu troféu ao meu
pai, e o convidei, na cerimônia de colação de grau à subir ao púlpito,
onde juntos leríamos um resumo das histórias que me ninavam quando
criança, ele subiu constrangido uma dúzia de degraus, de olhos
marejados de emoção; me abraçou tomou me o microfone e sussurrou: Eu
não sei ler!!!A confusão saltou me nas faces, e a vergonha de meu pai
me doeu o coração!!!Ele, ainda com o microfone em mãos se espôs, e
todas as estórias me vieram à mente, e me foi desvendado aquele livro
negro, e o suor de meu pai se tornou ainda mais precioso aos meus
olhos, então chorei em seus abraços. A manhã veio luminosa, e um lápis
traçou algumas letras tortas no caderno, e brincavamos como crianças e
meu pai tomou me o óculos e o livro, fingindo ainda outra vez que o
lia, e ao fecha-lo me chamou de doutor com um orgulho não disfarçado, e
se desculpou por mentir-"Queria que tivesse uma vida melhor, e sabia
que os livros lhe dariam isso...", e o abracei, orando para que meu
amor fosse uma recompensa suficiênte!!!E então fui mestre de meu mestre, e o
introduzi no mundo hermético das letras, e ele se dizia pleno, e se
maravilhava com cada frase, cada período, cada parágrafo, e ai estendi
lhe meu maior presente, um livro!!! Ele acariciou-o, e abriu a capa,
onde estava escrito: "Naquele rio de águas espelhadas em que perdi para
sempre um pedaço de meu coração...Era uma delicia, vívida,
dolorosa...", então seu sorriso brilhou mais que o sol!!!

Anderson Dias Cardoso. 

Deus no Espelho.


E disse Deus, façamos o homem à nossa imagem e semelhança (...e viu
Deus que tudo que criara era muito bom...).E vendo a mulher que o fruto
daquela àrvore era boa para se comer, e agradável aos olhos, árvore
desejável para dar entendimento...Foram se aberto os olhos de ambos...E
um outro Adão viu se no espelho, dia um rosto amargo, dia semblante
fechado. Consultava e conferia a imagem e semelhança em Deus , e pelos
seus próprios olhos não as via; Deus parecia não sorrir. Lançou se ao
espelho, e o desfez no chão, e nos olhos vieram lágrimas, quando os
cerrou, no escuro enxergou a morte, de susto afastou se, e no chão
encontrou se com milhares de Adãos, com a mesma estampa de tristeza, e
sentiu pena. A um deles apanhou com as mãos, e o envolveu com toda
lamúria mas seu interlocutor lho repetia, então desculpou seus
problemas, e sinceramente, fitou seu olhar, e se lembrou que foi lá que
tudo começou; quando viu o pecado, não mais enxergou à Deus...


Anderson Dias Cardoso.
Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...