quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Progeria.


Enlaçado ao braço e cheio de orgulho desfilava a nova namorada aos próximos e desconhecidos.
Uns olhos dançavam de canto à canto de suas órbitas, entre fofoca e observação, outros permaneciam estáticos como sorvedouros de surpresas.  Diferenças de idade nunca foram socialmente bem aceitas.
As roupas dele eram discretas, ela vestia uma juventude colorida para disfarçar muitas rugas, mas o efeito era tristemente inverso e eles se denunciavam como um casal estranho, destoante.
Ao andar pelas ruas disfarçavam a vergonha de sua diferença em conversas nervosamente animadas, e nos vácuos de passantes se lamentavam por não serem aceitos.
O namoro permanecia secreto aos entes, por conta dos mesmos efeitos experimentados pelos estranhos e aqueles passeios eram o laboratório para uma exposição de seus afetos, uma preparação para se assumirem aos seus pares.
A repulsa alheia não diminuiu ao longo dos dias, mas, acostumados à tais incômodos sentiam se mais confortáveis e seguros para demonstrarem afetos publicamente.
As mãos eram vistas freqüentemente atadas uma à outra, e as dele eram mais carinhosas, sempre tecendo afagos à face vincada, anteriores aos beijos apaixonados na delicada boca rugosa.
Agora a apresentava como um grande amor aonde iam, fazia soar confiante cada declaração de apreço e ela confirmava com voz infantil, tímida e sumida à círculos hipócritas que os saudavam e faziam votos de casamento; e se riam debochando dos dezenove anos desperdiçados do garoto com aquela simpática senhorinha ao verem que deixaram sua presença.
Eram o “escândalo” mais delicioso dos locais que freqüentavam.
Num dia frio arrancaram-na de um abraço. Eram três sujeitos parrudos e violentos, e ela gritou “Pai” ao mais baixo e ele ouviu ser gritado “minha irmã” da boca dos outros dois, e ainda “sem vergonha”, ”vagabundo”, ”pedófilo”, palavras entretecidas à socos e pontapés e outros insultos ignorados pela dor dos golpes.
Não a viu ser levada, seus olhos foram muito machucados.
O processo por pedofilia foi atenuado pela condição insólita do caso e rendeu o afastamento dos amantes e prestação de serviços comunitários ao jovem.
Eles se prometeram um ao outro e esperaram os quatro anos até a maioridade da velha menina, onde o poder da sujeição aos pais era menor.
Eles encontraram-se sem aprovação paterna, mas ainda sob outros tantos olhares desconfiados.
A doença havia consumido uns outros tantos anos da garota, mas o sentimento se conservava.
O beijo à boca enrugada trazia o gosto do amor verdadeiro, e isso os bastava.

Anderson Dias Cardoso.

2 comentários:

Masturbação Mental disse...

Acho que em qualquer condição, estamos sob o risco de sermos julgados de forma precipítada e preconceituosa, nesse texto o caso foi um pouco mais complexsss néh...e como sempre, matou a páu..hehe,
tenho grande fascínio pela Projéria, uma de minhas maiores curiosidades e pode vir a ser meu objeto de pesquisa...

Muits bon...até mais ler

Célia Ramos disse...

opa!!!Prestigiando aqui seu trabalho mais uma vez! Como sempre, excelente!
A sociedade não costuma aceitar aquilo que não lhes convém! Mas, cada pessoa deve fazer o que acha que é melhor para si!!! E as opiniões alheias servem apenas para que possamos saber que existimos!
bjos

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